30 de novembro de 2007

Artigo: Financiamento do SUS, por José Gomes Temporão

A população brasileira, a partir da Constituição de 1988, ganhou um direito que antes somente era reservado às pessoas que tinham recursos para pagar serviços de saúde particulares ou estavam cobertas pelo sistema público reservado apenas aos trabalhadores com carteira assinada. O marco legal determinou que a saúde é um direito de todos os brasileiros.

A partir de então, foi criado o Sistema Único de saúde. Hoje, 140 milhões de pessoas dependem exclusivamente do SUS para ter acesso aos serviços de saúde. As demais se beneficiam com freqüência de serviços, como campanhas de vacinação, vigilância sanitária, resgate de urgência, ações de combate a epidemias, transplante de órgãos e programas que oferecem medicamentos de alto custo. Uma rede de tamanha magnitude vem enfrentando diversos desafios. Umdeles é a questão do financiamento.

Neste ano, cerca de 40% dos recursos do Ministério da saúde provêm da CPMF, o que a qualifica como uma das mais importantes fontes de financiamento do sistema.

O Nordeste fica com um quarto do valor arrecadado e destinado à saúde. Isso por que todos os recursos são repassados integralmente para os Estados e municípios, que são responsáveis pela execução das ações de saúde localmente.

Em número, a região recebe R$ 4 bilhões para pagar as ações de saúde. Com os recursos, a CPMF paga cerca de 200 milhões de procedimentos de alta e média complexidades, o que significa serviços que vão de consultas especializadas a cirurgias.

Na Bahia, a contribuição pagou em 2006: 5 milhões de consultas, 10 milhões de exames, 2 milhões de raios-X, 1 milhão de ultra-sons, 451 mil procedimentos de tratamento do câncer, 510 mil hemodiálises, 59 mil ações para tratamento de doenças cardíacas e vasculares, 60 mil para doenças respiratórias em adultos, 61 mil para doenças respiratórias em crianças, 200 mil partos normais, 122 transplantes e 204 procedimentos coligados, 32 milhões de procedimentos ambulatoriais e 522 mil outras internações.

Na saúde, a CPMF é uma fonte segura de financiamento para o SUS. A saúde da população não pode se pautar pela indefinição em saber se, no próximo ano, o Ministério da saúde terá ou não recursos disponíveis para custeio e investimento da rede pública. O SUS deve estar pronto para receber as pessoas a qualquer momento, o que, volto a ressaltar, foi garantido pela Constituição.

Temos um sistema absolutamente inclusivo, que não discrimina sequer os que estão à margem de qualquer tipo de contribuição para a formação de seu orçamento.

Essa é a parte mais bonita e também o maior desafio do SUS: como administrar um sistema onde os gastos são sempre crescentes, já que o número de “associados” aumenta a cada dia, sem que se tenha um cálculo preciso de como esse acréscimo se dará ou em quanto tempo ou, ainda, quanto isso custará.

Na verdade, o SUS ainda é uma grande novidade. Embora esteja prestes a completar 20 anos, o que tínhamos antes era uma realidade totalmente diferente.

Após 20 anos de existência, é evidente que o SUS foi uma grande conquista da sociedade, mas que ainda precisa de melhorias.

Esse é um desafio diário e um compromisso do governo federal.

A grande questão que se apresenta hoje é como adequar o SUS à realidade, com a base de financiamento que o sistema tem hoje. Nesta discussão, a não-aprovação da CPMF seria uma tragédia. A ausência desses recursos deixaria o sistema de saúde em situação de colapso total, sem nenhuma possibilidade de enquadrar o sistema ao atendimento universal, como manda a Constituição. Não dá para fazer mágica.

Por outro lado, colocar recursos no sistema pura e simplesmente, sem mexer no padrão de gestão dos recursos, também é inadequado. Temos problema de gestão crônica, de subfinanciamento da saúde e uma baixíssima eficiência do gasto. Há uma crise extremamente grave e temos que mudar o padrão de gestão.

Exatamente por isso o governo propôs um novo modelo de gestão da rede hospitalar pública de fundações estatais de direito privado, projeto que já foi encaminhado para o Congresso Nacional. Além disso, na próxima semana, estamos lançando o PAC da saúde, que traz inovações como a contratualização dos Estados e municípios. Ou seja, para receber os recursos, eles farão uma espécie de contrato com o Ministério da saúde, que estabelece objetivos e indicadores de saúde que devem ser atingidos. Assim ficará mais transparente como se usa o dinheiro público, e a população será capaz de cobrar do seu gestor local.

* José Gomes Temporão é ministro da Saúde

Fonte: Jornal A Tarde