9 de dezembro de 2007

Em 18 anos, cortes com atendimento a pacientes chegaram a R$2 bilhões

A economia que o governo brasileiro fez nos últimos 18 anos, ao fechar cerca de 80% dos leitos psiquiátricos – de 120 mil leitos em 1989 para 38,8 mil em 2007 – não tem sido aplicada no atendimento a doentes mentais. Um estudo da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) aponta que, neste período, houve corte de dois terços da verba – o equivalente hoje a cerca de R$2 bilhões por ano. O investimento, que era 5,8% do orçamento do Ministério da Saúde em 1995, caiu para 2,3%, em média, nesta década. Em 2006, a saúde mental recebeu R$943, 2,04% do orçamento do ministério.

– A perda de investimentos, associada à redução dos leitos, gera a desassistência que pode ser observada nas longas filas de espera, no crescente número de doentes mentais vagando pelas ruas e também nas prisões – disse João Alberto Carvalho, presidente da ABP.

O Ministério da saúde contesta e diz que não houve redução de verbas, mas admite que precisaria ampliar os gastos anuais em saúde mental para, no mínimo, 5% de seu orçamento – o equivalente a R$2,3 bilhões hoje (R$1,3 bilhão a mais por ano). O coordenador nacional de saúde Mental, Pedro Gabriel Delgado, concorda que os gastos precisam ser, no mínimo, dobrados.

"A psiquiatria é o patinho feio da medicina no Brasil"

Estudo da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), em conjunto com o Ministério da saúde e a OMS, lançado na última segunda-feira em São Paulo, mostra que o investimento está abaixo do necessário.

– Faltam investimentos. O dinheiro aplicado é insuficiente. A psiquiatria é o patinho feio da medicina no Brasil – disse um dos autores do estudo, o professor da Unifesp Jair Mari.

O estudo mostra que, em 2005, a verba total do SUS foi de US$15 bilhões (US$82,7 per capita), e que a saúde mental ficou com apenas US$ 358 milhões (US$1,95 per capita). O documento afirma ainda que o país conseguiu humanizar serviços, com o fechamento de manicômios, mas admite que não há um monitoramento efetivo dos serviços prestados.

Na avaliação da ABP, é preciso fazer mudanças no modelo. As críticas são de que o sistema atual, que adota as diretrizes defendidas pelo psiquiatra italiano Franco Baságlia, no início da década de 60, são ideológicas e não científicas. Pelos princípios da Luta Antimanicomial, os loucos não são doentes. Para os psiquiatras, no entanto, o governo não considerou que a ciência evoluiu com medica mentos e tratamentos que evitam a dor e os surtos dos doentes mentais.

– Associam a psiquiatria ao manicômio e criaram um estigma na reforma. Ninguém aqui defende manicômios, mas que o governo invista em hospitais de psiquiatria, com especializações e tratamentos adequados, modernos – disse o presidente da ABP, João Alberto Carvalho.

Fonte: O Globo